terça-feira, 29 de novembro de 2011

Flocos de infância (Infância paulista, infância interiorana)

Quando menina, mamãe me protegia da chuva mais do que nos outros dias. Era sempre necessário ter casacos, guarda-chuvas em mãos... e as botas? Ah, essas eram imprescindíveis. Costumava-me incomodar o cuidado e também a falta de neve. Hoje é somente o frio da neve e a falta da proteção.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Aos sobreviventes.


Cecília gosta de nozes e de deixar as cascas pelo chão da casa. Não, não seria paciência a palavra. É o que dizem. Há algo maior entre as sementes, a casa e a menina. Além de comer; Dança. Adulta. Jovem-viúva. A eterna dona dos pés descalços. Vida não sei. É tarde. O frio deixa as coisas cinzas. Ela permanece feita em cor.

Cheiro azedo de freios das locomotivas. Eram quinze e não doze os que lá estavam. Ela ainda descasca frutas. Meninos correm com pipas em lugares isolados e desérticos do país tropical. Chuva no sul. Chuva no norte. Seca as roupas estão no terraço das favelas. Seriam violinos os aspectos dignos dos olhares das bailarinas. Ela desfruta-se. Enrola. Corre. Cigarros pelas ruas cheias de fome. "Nós teríamos conseguido", diz aquele que passa antes de pegar o ônibus. Avenida grande e iluminada. O país é este do nome com B maiúsculo. As impressões são outras.

Sapatos não interessam para caminhantes vazios. É preciso ter um caminho cheio para notar tamanha sutileza. Conformar-se com o fato de que couros não são assuntos para todos. Tão pouco os livros. Macarrão. É tempo de festa. Não se vê alegria naqueles que comemoram. Vê-se alegria nos que não sabem nem que dia é hoje. Cecília roda. Cecília noite. Mas ainda é dia...

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Da escolha do teu nome, Beatriz.


Quando soube de tua chegada pensava se continuariam a construir muralhas. Se os homens ainda pisariam em planetas distantes, ou se ao menos continuariam a mentir para nós que vida mesmo, boa e mansa, nós só encontraríamos aqui na terra. O mundo encantado que eu criei desde menina queria agora ser transportado para o ser do meu útero. "Mas.. como fazê-lo, criança? Se ainda nem sei como chamá-la, não vejo nem a cor de seus olhos e também não sei se posso falar que és Odara?"
Teu nome sempre foi algo que me acompanhou. Antes mesmo de saber se tu realmente virias, mais que isso, que virias de mim. A princípio tu te chamavas Cecília. Sim, este foi um dos modos que encontrei para trazê-la já como poesia a este mundo tão apagado, que temia que fosses cair, caso não criasse um mais artístico só para ti. Este nome não seria apenas o seu registro, mas lhe serviria também como alma e proteção. Lhe traria a maravilha, os olhos radiantes, a curiosidade eterna e infantil. Porém, com o passar do tempo, optei por lhe chamar de Beatriz. Nessa época eu lia a Divina Comédia e notei que Beatriz é nome de mulher amada, menina meiga, menina que pode livrar Dante do inferno;e quem sabe deste modo, tu não viesses, quase que política, livrar os homens e mulheres, que aqui vagueiam, da falta de arte?
Beatriz, esse é o nome com o qual eu não somente a chamava, mas a criava e dançava nas noites sozinhas contigo a crescer em mim, e em todos os cantos da casa. Nós sempre cantamos "será que é loucura? Será que é cenário a casa da atriz?" com uma felicidade e tristeza descabidas, que somente nós duas podíamos controlar. E saibas, mesmo que eu não a acompanhe o resto da vida, dei-te este nome de mulher amada, para que sempre se lembres de que foi nós duas quem construiu a ti, e que eu passei a viver melhor quando me permitiu ser tua parte mais feliz. E que fomos nós também quem construiu sua alma de Beatriz-céu, Beatriz-divina, Beatriz-comédia, Beatriz-menina; dentro de 9 curtos e rápidos meses para que tu soubesses que "sempre é sempre por um triz" mas que com a sua chegada o mundo seria "pra sempre Beatriz"...,
De sua eterna mãe menininha.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Colli.

As vezes eu te procuro no olhar intenso e agitado que marca tua face. Juro, há muito por encontrar!
E, desculpe-me a franqueza, ou você desconhece sua inteligência, ou esconde na simpatia do sorriso ansioso a explosão de pensamentos criativos e gigantes.
Não preciso dizer (mas digo) que a primeira opção sirva apenas para alimentar minha curiosidade.
“Menina, como você é grande!” Não te dizem meus olhos?! Eu visiono, projeto, constato você.
Será que você também se procura, será que já se sabe?!
Confesso, tarefa louca à qual me lancei, tento decifrar-te para mim, para os outros, para ti. Escondes-te mulher, na menina da expansividade?

Não sei mais quais caminhos trilhar, pois, tudo foi iniciado quando parei meus minutos (alguns deles) para me pôr a pensar sobre quem és (empenho-me nisso tão espontaneamente a cada vez que te vejo vibrando por entre, por sobre, dentro dos livros, nas entranhas do conhecimento, no passeio pela cultura e arte, na busca incessante do saber, quando leio algo que escreveu). Por agora, declaro minha admiração, é tudo o que posso fazer.

“Menina, como você é grande!” Não te diz minha procura, que pouco da sua grandeza pode ver?!

Que esta seja a estreia de uma série, seja lá do que for.
É possível que nunca uma jovem amiga me tenha ocasionado tamanha admiração, confesso.

Ou é grande minha ingenuidade, ou minhas projeções cumpri-ser-ão. Não preciso dizer (mas digo) acredito tão mais na segunda assertiva.

Sua (provavelmente) mais recente admiradora,

Samara Belchior.

(Texto de Autoria de Samara Belchior)

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Carta a Sebá

Mon Cher Sebá,
(ao som de Billie Holiday)

Por aqui, nesta noite fria do dia 24 de agosto, uma dupla joga xadrez, enquanto um outro garoto assiste a um culto
filme alemão, outros dois, talvez mais interessantes, estudam partituras de choros para flauta. Estou no apartamento vizinho, fumando um maldito cigarro
com a visão de meu novo livro do poeta de Praga, trata-se do Castelo de Kafka. Que livro, Sebá, que livro. Quanta genialidade contida em um homem magro e triste. Pela manhã estive na USP para as ditas aulas de inglês, lá, em um breve encontro de olhares e sorrisos, encontrei-me com o professor Frankilin Leopoldo e Silva, baixote, gordinho e amável. Ele é um primoroso leitor de Camus, apesar de eu estar me afastando das filosofias da existência e de suas possibilidades de falsa vida. Assunto para discutirmos depois. É de se impressionar como certas brevidades se tornam eternas em seus pequenos momentos, Frankilin e sua amabilidade me acompanharam ao longo do dia. Após a aula, fui a UNIFESP de São Paulo, é um lugar divino em sua estrutura e medíocre em seus frequentadores. Por lá, deparei-me com uma velha banca de jornal que trazia novos filmes da coleção da folha. O último tango em Paris sempre me faz querer consumi-lo apesar de já o ter adquirido e assistido inúmeras vezes desde 2008. Digamos que este pode ser o mal do capitalismo tardio traduzido no tédio que me acompanha nas passagens de São Paulo, deve ser somente por isso que ainda penso em comprá-lo.
Na verdade, gostaria mesmo de contar que na sexta-feira passada tive o prazer de falar com a gigante Benjaminiana Olgária Matos. Ela é um dos seres mais amigáveis e estimulantes da filosofia. Desde o nosso encontro, no dia 19/08, ela me chama de Bonitinha . Há graça nesse diminutivo, não nego, porém, existe nele também uma grandeza de sentimentos inexprimíveis que talvez você compreenda sem a necessidade do verbo.
Não posso dizer muito pela internet, porque ela não tem as mesmas cores de nossas conversas pessoais, mas espero que tenha conseguido demonstrar algo de docemente triste através deste pequeno número de linhas.

Sinto sua falta, como sinto falta da arte dos séculos passados e da efervescência dos nossos anos de ouro.
Um abraço,
Sua Lucy.

sábado, 18 de junho de 2011


"L'homme qui ne peut pas visualiser un cheval au galop sur une tomate est un idiot» - Breton.
(Grande imagem de Breton, com uma frase significativa para o surrealismo)

domingo, 3 de abril de 2011

Benjaminiana...

"Se a fumaça na boquilha dos cigarros e a tinta na caneta tivessem fluxo igualmente fácil, eu estaria na Arcádia de minha arte de escritor." (W.B. in Rua de mão única)

quarta-feira, 30 de março de 2011

Do estilo.

Fere de leve a frase...E esquece...Nada
Convém que se repita...
Só em linguagem amorosa agrada
A mesma coisa cem mil vezes dita. (Quintana)

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Balada de um homem velho.


Sou um andarilho, cheguei aqui em cima só para ver o que acontece lá em baixo. As pretensões ficaram para trás, não uso óculos de grau, mas posso dizer que meus olhos estão gastos de tanto observar, não me arrependo por isso.
Vi a bela magnólia flosrecer, ainda não sei o que isso significa. Chorei, choro por sua beleza.
Não me tornei um poeta,minhas músicas não tocam no rádio, sou menos fatalista do que antes, permaneço um fazendeiro.
As palavras me faltam, contudo, sou consumido pelo fulgor e significado de cada uma delas todas as manhãs. O verso muda o resto, há enganos na prosa. Sou um dramaturgo, ou um mentiroso.
De alguma forma, rapaz, posso lhe dizer que atingistes a liberdade antes de conhecer a técnica! Isso é possível?
Pensei que depois daquele tempo poderia dizer que não me sinto cansado, culpado, ou triste, mas a minha jovem ilusão passou a perna nas conclusões antigas.
Vejo Allen Ginsberg da janela, ele sorri. Ele era um bom andarilho, um semi-deus... esses caras insistem em apenas passar pela janela e não param nem para um cigarro.
Aragon esteve aqui, breton e tantos outros.
Abençoados sejam aqueles que ainda confiam em seus sonhos.
Recebo a benção na hora de dormir. Desisti do café e de sua antiga filosofia: "Sleep is for dreamers."
Conheço pelo menos 136 cantores de protesto e nenhum de lirismo puro.
Será que o mundo tem sido valorizado ou prendemos o valor em uma só espécie?
Ser-humano está além de andar pelo quarto e perguntar o que acontece por aqui.
Não se esforce tanto, você não pode entender o que acontece fora de você.
Ou... você pode?
Essa geração diz que seu mal é a depressão.
Você diz é impossível, eu trabalhei para que as coisas melhorassem.
Essas antigas visões ainda não te deixam em paz.
Podemos começar a acreditar naquilo que ainda não foi feito;
Não é, mister?
Boa noite!

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Abstraia!


''Não sinto a necessidade de transformar tudo
numa obra de arte, mas sim de narrar o que é diferente." Camus


Fim de tarde. Saio com o carro pelas estradas, como uma velha beatnik, com duas pessoas já inclassificáveis em minha vida. Antes disso, o tédio engolia-me, dilacerava cada parte de minha bela juventude. Isso acontecia porque olhava os campos da janela, sentia a luz do sol no meu corpo, ainda sim, distantes. Pensava -estar presente no mundo vai muito além de olhar pelo vidro as coisas acontecerem.
Como disse, sai de carro. Começei a sentir a brisa em meu rosto, batia suavemente em minha pele, como se dessa forma contasse as estórias de outros jovens, em lugares longínquos encontrados, mas com a mesma ânsia pela vida.

Percebo, neste momento, que a graça não vem mais do saber, mas sim do presenciar.A pureza encontra-se no ser na medida em que se esta. Eu estou aqui e sou tomada por um ataque empírico. Nada no meu corpo responde, além dele mesmo, por inteiro. Não saio de mim, pois aqui encontro o mundo pleno.

Dancei! Dançar é ser brisa.
Notei! Noto que quando me diziam -Abstraia! o significado era o mesmo dos quadros abstratos. Não a fuga da realidade, mas a visão dela com os olhos de todos os sentidos, com a mistura da matéria que sou feita, que não me traz nada de concreto, mas muito do que existe. Existir não é prático, não é real.
Estamos cercados de beleza, a beleza não compartilha com a realidade prática.

Crescer, contemplar e viver, nada me soa mais belo e verdadeiro do que isto.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Sobre o meu 'render-se' ao Sr. Sigmmund Freud.



Em ultima análise, todo o sofrimento
nada mais é do que sensação, só existe
na medida em que o sentimos, e só o sentimos
como conseqüência de certos modos pelos quais nosso
organismo é regulado.” (Freud)


É fato que todos nós já ouvimos falar da ilustre figura alemã, de seus pensamentos, de sua psicanálise e de seus estudos com Ana O. Porém não é com a mesma facilidade do “ouvir falar” que começamos a nos aproximar de sua obra.
Não sei se pelo motivo de todos o adularem, desde minha (não tão remota) infância, recuso-me a gostar de seus escritos. Contudo somente ao ler o livro de sua autoria “O mal estar na civilização” decidi render-me e admitir que a inteligência de um homem deve sim ser conhecida pela contribuição genial que ele pode dar a humanidade e a sua própria existência.
Como um clarão, este velho senhor veio até mim hoje, pela manhã, dizer-me que não apenas a minha felicidade, mas também o sentimento de prazer que circunda a história civilizatória está mais ligado as nossas fantasias (nomeiem como quiser, arte, revolução, religião, amor...) do que a realidade de uma alegria continua.
Com grande realização e bem estar tento demonstrar que é este o portador de um pensamento belíssimo e humano. Não o reconheci academicamente, tão pouco fui procurar em seu livro respostas, não obstante encontrei nele as perguntas e as avaliações necessárias para poder argumentar os motivos de sua fama e repercução.
Apesar do parecer bobo deste texto, há nele um grande significado:
a descoberta por si mesma de uma capacidade de compreensão ainda não experimentada.
Aos que não leram, tentem aproximar-se da obra deste fiel escritor, se houver a compatibilidade, comuniquem-se. Aqueles que já leram, ainda sim, falem de suas impressões sobre a obra aos outros “companheiros de viagem”.
Peço, apenas não deixem passar aquilo que nos foi revelado, sem dogmas ou teologias, sobre o poder que nossa mente exerce nos mais diversos assuntos,
sejam estes subjetivos ou universais.
Cito novamente um trecho de seu livro, “Quando qualquer situação desejada pelo principio do prazer se prolonga, ela produz tão somente um sentimento de contentamento muito tênue. Somos feitos de modo a só podermos derivar prazer intenso de um contraste, e muito pouco de um determinado estado de coisas.”
Há aqui provas de que a humanidade estará em uma eterna luta entre Eros e Thanatos, conquanto a diferença está na simplicidade da exposição freudiana de nossa infinita dicotomia.
A aceitação desta dupla como engrenagem do progresso humano não me seria tão palatável caso eu não os visse no meu cotidiano, lutando entre si para que eu sobreviva e muito além disso para que eu me sinta VIVA.

Devido a isto não me vejam como mais um de seus aduladores intelectualizados, mas sim como um ser humano que agradece a luz que lho é entregue pela manhã. Agradece ao ver que algo se ilumina nele quando vê um grande astro dando-lhe sentido para continuar com aquilo que já existe.

Bom, é só.